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28 de jul. de 2012

Estupro mental na tenra infância



Já prometi a mim mesma que, caso algum dia eu tenha uma filha, farei o máximo para que ela não seja contaminada por uma dessas histórias infantis fascistas, em que uma linda princesa vive sua vida em função da espera pelo pênis-salvador-que-irá-livrá-la-de-todos-os-males-terrenos. Sim, porque para encontrar a salvação, o príncipe bonitão é a única opção. Você só deve se manter a mais linda do reino e esperar com o rabo sentado um macho vir te salvar. De preferência limpando, cozinhando e lavando um castelo cafona.

Para ficar ainda mais romântico, a mocinha renegada, linda e pobre, ainda sofre todo o inferno causado por uma maluca sociopata, que em geral dava a ximbica para o pai da princesa enquanto vivo.  Afinal, se a mulher dava para o seu pai, mas não era sua mãe, com certeza é uma puta de uma vaca. O extremo oposto da princesa, poço de bondade e ternura. Sim, porque a natureza humana é exatamente divida dessa forma: existem pessoas que são o exemplo de tudo que é correto e representam o bem, e pessoas que abrigam apenas a maldade em seu amargurado ser. Ou é do bem, ou é mal, nada de meio termo. Tipo aquelas baboseira que, depois de passar da fase dos contos infantis, os adolescentes aprendem assistindo Malhação, simpática programação exibida todas as tarde na televisão. Patético é pouco. Isso é esquizofrenia total.

Mas voltando aos contos de fadas. Depois de todo esse drama, o amor tudo supera. E princesa e príncipe se casam (porque tem que ter um casamento no final) e vivem felizes para sempre. FELIZES PARA SEMPRE! Agora alguém só me explica que porcaria é essa de felizes para sempre? Sim, porque como todos nós sabemos, todos os relacionamentos terminam felizes para sempre depois do casamento, certo? Nada mais correto do que reforçar essa ideia nas mentes e corações infantis, certo? Pelo amor, essas histórias deveriam ser proibidas para crianças, que crescem escutando (e muitas acreditando para sempre, mesmo que inconscientemente) nesse tipo de baboseira. Meninas acreditam que devem, de fato, ser lindas princesas, durante toda sua bela vida, que obviamente, está destinada à felicidade plena, exatamente como condenam todos os contos de fadas.

E se por algum mero acaso uma infelicidade do destino não te proporcionar a beleza única e cativamente que vai arrebatar os corações de todos os falos pulsantes, fazendo com que os moçoilos caiam aos pés de sua vagina virgem (sim, porque a xeninha não pode ser deflorada para a história ser completa), não se preocupe, a indústria de plásticas, cosméticos e pílulas milagrosas tem o poder de te transformar (ou quase) em um pitelzinho de primeira linha. Sério, é capaz de, depois de uma boa transformação, você se olhar no espelho e sequer se reconhecer. Olha que legal. Virar uma princesa igual a dos contos de fada é uma questão apenas de dinheiro, querida. E para a maioria de nós, reles mortais, muito dinheiro. Se você não tem, ah-ha, se fode aí, baranga.

Brincadeira de criança
A verdade é que nós mulheres sofremos lavagem cerebral desde o primeiro dia em que somos cuspidas a essa malfadada existência. Recebemos bonecas de presente de aniversário, para já irmos aprendendo a cuidar com maestria dos projetos bizarros de bebês. Mas vai a menininha querer brincar na rua, correr, soltar uma pipa, para não surgir aí o problema? É um tal de mãe histérica berrando “isso é coisa de menino, garota, sai daí que você não é muleque!”. O oposto também acontece. Já vi muito menino querendo brincar de boneca, brincar de comidinha, e ouvir esporro dos respectivos genitores, do tipo “isso é coisa de menina, porra, tu é viadinho, por acaso?”.

O negócio é o rapazote aprender ainda novinho pela boca dos próprios pais que ele tem que sair metendo o pinto em tudo quanto é garotinha, enquanto a garotinha aprende que tem que esconder a pepequinha de tudo que é menininho. Isso desde a mais tenra infância. Péssimo. Deprimente. Mulheres já aprendem desde crianças a conviverem com uma repressão tão entranhada, que a maioria dos grandes papis-educadores sequer percebe, ou não se dá ao trabalho de perceber. Enquanto isso, os homenzinhos crescem aprendendo as táticas de como ser fodão, livre, leve e solto, com seus brinquedinhos que, sem nenhum remorso ou culpa, podem incitar a violência à vontade. Para as meninas, Barbies que são a total representação de modelo estético impossível à raça humana. A sociedade é patética.

Aí a gente cresce. Sim, nós crescemos. E depois de sofrer esse estupro mental durante todo o início de nossa construção cognitiva, depois da repressão imposta pela escola, pela família, pela mídia, antes mesmo que saibamos como soletrar nossos nomes, somos obrigadas a ouvir como resposta a algum surto psicótico “isso é coisa de mulherzinha”. E quando poucas de nós conseguem lidar com esse total estupro mental sofrido durante toda a infância e fugir dos estereótipos repressores impostos pela sociedade (o que não nos impede de entrar em sérios conflitos existenciais, é claro), somos julgadas, mal interpretadas, isso quando não aparece um babaca (em geral, muitos babacas) confundindo liberdade de pensamento com libertinagem generalizada.

 E quer saber? Foda-se também se eu quiser ser libertina. Nunca tive vocação para Cinderela. 

5 comentários:

  1. muito bom o texto!!!!
    meu orgulho!!!
    Thalita Rocha

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  2. Palavras de Blindex: Uma chave que abre várias fechaduras é chamada de Mestra, uma fechadura que é aberta por várias chaves é uma porcaria!!! Já dizia mamãe: Prenda suas Cabritas que meus Bodes estão Soltos!! kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

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  3. Piña coladinha chutando o balde da (de)formação moral e intelectual para a passividade.
    Fazia tempos que não pasava por aqui e teu estilo continua uma delícia.

    Beijão.

    Ricardo Mainieri

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  4. Grande artigo! Muito bem escrito, mesmo! Quanto a mim, apesar de homem,sempre tive uma alma mais feminina (ou o que é tradicionalmente considerado como feminino). Apesar dos meus pais nunca terem reprimido as minhas brincadeiras de criança com as meninas do bairro, brincando de boneca por exemplo, eu me fui sentindo meio que policiado pelo resto da sociedade e escondia a pessoa que era para não passar vergonha (olha que triste). Mas secretamente eu continuava me desenvolvendo e forjando a minha sensibilidade e personalidade. E claro que absorvi bem cedo toda essa merda de principe e princesa e também idealizava viver feliz para sempre com o meu principe que na altura eu idealizava como uma espécie de Papai Noel com t-shirt justa e piercing na sobrancelha. Como resultado sofri um desapontamento brutal no inicio da minha idade adulta e creio que sequelas dessa lavagem cerebral ainda irão infelizmente perdurar pelo resto dos meus dias. Creio que é bom as crianças crescerem com um olhar otimista e esperançoso sobre a vida em geral, mas contar mentira e ensinar coisa errada não vale, né?

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Áhh, que fofo você comentar!!!