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6 de dez. de 2013

Maldição do Candy Crush



Conheces tu a maldição do Candy Crush?
Repetirei a história que me foi narrada
Moça que brinca com jogo de pirulito
Fica dois anos sem levar pirulitada!

Pois não conheces a anedota do joguinho?
Que virou moda entre meninas bem sapecas:
Moças que brincam com balinha açucarada
Ficam dois anos sem chupada na pepeca!

Pois ora moços não se safam do suplício
Para os danados que só querem bole-bole:
Rapaz que joga Candy Crush todo dia
O pirulito vai virar maria-mole!


Lição de moral: larguem a merda desse jogo e vão transar. 

27 de nov. de 2013

Surpresa literária



Lá vou eu, passeando pelos sebos da vida, quando me deparo com a coleção “Obras imortais de nossa literatura”. Vi o livro As tardes de um pintor e, como eu não conhecia o seu autor, Teixeira Sousa (perdoem-me uzamiguinhos letrados-pseudo-cult), resolvi pegar o exemplar e me aventurar em uma leitura clássica do romantismo, já que o livro foi publicado em 1847.

Tudo bem que eu já esperava aquela lenga-lenga de amor-platônico-jamais-consumado, meninas-virgens-de-seios-alvos-imaculados e tragédia-xêrau-morre-no-final, mas as enxurradas de discursos preconceituosos ao longo da narrativa foram para mim uma surpresa. Discursos que legitimam com a maior naturalidade uma série de estereótipos comuns à época e que ainda hoje têm seus reflexos.

Encontrar isso em uma coleção intitulada “Obras imortais da nossa literatura” me deixou, no mínimo, decepcionada. Mas não vou ficar aqui questionando qual é o critério para que um autor seja eleito um puta de um escritor, já que Monteiro Lobato, racista até dizer chega, é referência de literatura infantil. Logo, em vez de ficar divagando em minha costumeira enrolação, resolvi reproduzir aqui alguns trechos do livro, com direito, é claro, à algumas observações.

“Justo era cigano, e em nada desmentia o caráter de sua raça vagabunda, interesseira e desamorosa”.
Ou seja, todo cigano é filho da puta. Uma ótima generalização, dessas que você ensina para as criancinhas, desmerecendo toda a cultura de um povo, que só sabe ser vagabundo, interesseiro e desamoroso.

“Os índios de sexo masculino eram por natureza indolentes, e bem que amigos de novidade, eram contudo baldos de todo talento inventivo; as mulheres, como sabemos, além de lascivas, eram incontinentes”.
Sim, porque os índios prestam apenas para serem escravizados por nós, brancos-de-raça-superior, que “por natureza” somos civilizados.

“-(..) Porque aquele homem tem cara de judeu.
  - Mas quem vê cara não vê corações.
  - Quase sempre, meu filho, quem tem má cara, tem mau coração”
Então, todo judeu é também filho da puta. Se for feio (e narigudo) então, aí é que é filho da puta mesmo. Talvez isso explique o holocausto.

“É triste maneira de conciliar a obediência filial com as simpatias do coração! Triste, muito triste! Morrer para não desobedecer a um pai, e para não se casar com quem não se ama, é um sacrifício desnecessário e talvez estupidamente oferecido às leis paternais e ao próprio amor! Mas esse sacrifício todavia é sublime!”
Ou seja, desrespeitar o papaco num pódi. Nesses casos, recomenda-se o suicídio. Você não casa com quem não ama, não descumpre o desejo de seu progenitor e ainda sai de a-bunita-coitadinha-mártir-sofredora.

“Abraçou o ateísmo com uma convicção robusta e inteiramente arraigada em sua alma! Tendo o jovem chegado a esse ponto, que muito era que se arrojasse ao medonho abismo, em que negrejam e redemoinham os mais hediondos crimes?!”
Quem é ateu também é consequentemente ladrão, assassino, estuprador (se é que para o Teixeirinha estupro é crime e não culpa da moça que se deixou deflorar), tudo de pior na face da terra, porque não aceitou xêzuis no coração.

E apesar de, é claro, já esperar esse tipo de discurso, eu não poderia deixar de reproduzir aqui a tradicional referência à mulher nesses tipos de livro, que é aquela que eu, que você, que mais um monte de gente cresceu ouvindo ser a clássica moça-para-casar. Aquela que quando eu tinha nove anos eu queria ser, já que era apaixonada por esse tipo de literatura e sonhava em viver um amor-avassalador-tipo-conto-de-fadas. Mas que logo depois eu desisti de ser, já que percebi não ter a mínima vocação para o “tipo-de-moça-para-casar”, nem ter paciência para o “tipo-garboso-senhor-cavalheiro” que quer uma “tipo-de-moça-para-casar”.

“Clara... encantadora Clara... mulher tão formosa e tão bela... mulher tão digna de uma felicidade suprema... Clara, tão bela, tão formosa, quão inocente, quão pura, quão virtuosa! (...) Diríeis que era uma virgem bela como suas esperanças; pura como seu amor; e inocente como sua infância (...)”
Traduzindo: deu antes de casar? Tudo puta.  

Depois dessa enxurrada de clichês, lugar comum e preconceitos sem fundamento algum (não desmerecendo a referência ao suicídio-santificador), alguém duvida que se hoje Teixeira Nunes fosse vivo, ele seria um reaça com coluna exclusiva na Veja?

E aí, vocês me perguntam: por que você continuou lendo esse livro? Digo que para fazer uma análise crítica do tipo de literatura que me agradava quando eu ainda mal sabia ler. Uma pré-adolescente que entendia o conteúdo, mas ainda não tinha capacidade cognitiva de fazer uma avaliação crítica do conteúdo consumido, e sem perceber vai incorporando uma série de discursos como legítimos, afinal, está escrito no livro. Para minha felicidade, aprendi a me libertar de muitas construções sociais que me foram impostas durante toda a vida, tão “naturais” quanto nocivas.    

Ainda assim, li.  Li tudo e achei o livro um porre. Li esperando muito chegar ao final, para poder enfim degustar com vontade (pelo menos assim espero) minha próxima leitura. O final da narrativa não me surpreendeu em nada, todos os malvados foram para a caixa prego, a heroína virgem morreu virgem (sem ver um pintinho sequer), e o mocinho ficou sofrendo.


Mas o que mais me chocou foi que, na última página, apesar de não ter gostado da estória, apesar de tudo que eu citei aí acima, apesar de estar de saco cheio do livro... eu chorei. Fiquei triste pelo moço bonzinho que se fudeu o enredo todo e resolveu virar frade franciscano nas últimas páginas. Talvez sejam vestígios da leitora juvenil que ainda existe em mim, ansiosa por romances-óbvios-mamão-com-açucar. Vá entender. Acho melhor ir agora de Chuck Palahniuk.

25 de nov. de 2013

LULU chegou



Em uma conversa cotidiana, um amigo relatou um caso particular. Hetero-de-pinto-voltado-para-fêmeas, foi se aventurar em uma dessas boates cariocas gays caréssimas, para aproveitar o esquemazinho que arranjou em um camarote. Porém, ele não deixou de narrar a agonia que sentiu toda vez que precisava ir ao banheiro. Era constantemente assediado por homens, o que causou nele um grande incômodo. Como se gostar de bater pintinho com pintinho fosse sinônimo de um exemplar-tarado-subversivo.  

“Então quer dizer que pela primeira vez na sua vida você teve a sensação de saber como é ser mulher? Sentiu durante algumas horinhas o que nós mulheres vivenciamos o tempo todo?”. Visivelmente ele ficou chocado com a minha pergunta. Provavelmente porque, pela primeira na vida, ele se viu obrigado a refletir sobre. Claro que o meu questionamento causou no mínimo um formigamentozinho anal. “Eu não senti nada como é ser mulher!”, bradou, incomodado pela possibilidade de se ver comparado ao tal “sexo frágil”.

Ainda hoje uma amiga postou em seu facebook as peripécias de duas mulheres sozinhas que se aventuram livremente em uma caminhada à noite, em um dos mais tradicionais bairros da zona norte carioca. Ela postou algo como “fomos abordadas por dois homens dentro de um carro, que nos chamaram de gostosas. Como não olhamos, eles gritaram ‘piranhas’ e foram embora”. Um recado para os machões-de-pinto-ereto que acham graça nessa brincadeirinha, por mais elogiosa que pareça ser: para qualquer mulher, ser abordada no meio da rua por um carro, à noite, já é NO MÍNIMO motivo de desespero. Acho que eu nem preciso explicar o porquê.

Ontem eu estava em uma festa de aniversário, fazendo o que sei fazer de melhor. Tomando minha cerveja, dançando muito, rindo mais ainda. E ouvi de dois amigos o que eu ouço com uma frequência maior do que eu gostaria: “Se a gente não te conhecesse, acharíamos você uma piranha!”. Não que me incomode o status “piranha”. Dar é muito bom e faz bem para a pele. O que me incomoda e associarem minha espontaneidade a qualquer tipo de abertura sexual. Como se uma mulher que bebe, dança e ri fosse sinônimo de uma mulher que está doidinha para dar.

Dizem que a vida é muito mais fácil para mulheres, principalmente se forem bonitas, porque elas conseguem tudo o que querem. Não, não é, principalmente se você trabalha rodeada por homens. Você ouve cantadas “inocentes” todos os dias. Você ouve piadinhas machistas que, em sua maioria, você sequer tem vontade de comentar, tamanha a imbecilidade das pessoas que as pronunciam. Muitas vezes, sua capacidade profissional é questionada em detrimento do seu rostinho bonito. Talvez porque respeito e reconhecimento sejam apenas privilégios relegados a homens.

Uma propaganda da Gillette causou indignação em muitos machos, por fazerem com que se sentissem apenas um objeto que merece ser subjugado por ser “peludo”. A mesma propaganda foi parar no Conar. Sobre o caso, li um comentário que me fez sentir, digamos, realizada pelo reconhecimento da espécie-macho-de-polegar-opositor: “Estamos sentindo pelo primeira vez o que as mulheres sentem a vida toda”.

Sim, porque nós mulheres crescemos sendo violentadas pelas propagandas que nos ensinam a sermos princesas belas e intocadas, com o cabelo perfeito, a pele perfeita, o corpo perfeito e, é claro, sem pelos. Não me lembro de meninas cabeludas fazendo um motim por se sentirem ofendidas com propagandas de produtos de depilação. Deve ser porque meninas cabeludas são “porcas”. Não foi isso que você cresceu ouvindo?

Vem, Lulu, vem
Mas toda essa lenga de lenga de exatos sete parágrafos foi para falar sobre o novo aplicativo que virou a onda do momento. O tal do Lulu. Nele, mulheres podem avaliar os homens, em escala que vai desde ao bom ou mau comportamento do moçoilo, até a performance do cara na cama, com direito à descrição do tamanho do membro peniano do rapaz. Vi várias amigas comentando o quanto o app é engraçado. Tudo muito legal, tudo muito bonito, não é mesmo?

Pois é. Não, não é. “Mas os homens sempre fizeram isso com a gente”. Foda-se. Sou politicamente correta? Judge me. Não tive coragem de instalar o aplicativo, porque não consigo me imaginar vendo amigos, parentes, pessoas queridas sendo avaliadas e servindo de chacota para meninas que acham divertido humilhar os outros ou usar a ferramenta como meio de vingancinha particular.

E não me venham falar da “função social” do aplicativo, que seria alertar as pobres meninas-virgens sobre o carinha que elas estão interessadas. Pelo o que ando lendo por aí, não é bem para isso que o programa está servindo. E sim, estou falando sobre algo o qual não tive contato direto, já que eu não baixei o Lulu. Aos incomodados pela minha "total falta de ética jornalística", bem... lamento.

Que mulheres são essas que clamam por igualdade e aproveitam a primeira oportunidade para fazer com os outros exatamente o que sofreram durante toda uma história de violência, de humilhação, de usurpação de seus direitos mais básicos? Será que essas mesmas mulheres que encaram apenas com uma “brincadeira” o aplicativo achariam a mesma graça se fosse criado esse app para os homens? Afinal, até quando o discurso “mas foi só uma brincadeira” vai servir como justificativa para uma enxurrada de ofensas e legitimação de preconceitos?

O mais interessante é que os homens simplesmente são obrigados a fazer parte do aplicativo. Se eles quiserem a exclusão, devem acessar um link informando. Mas deixem-me pensar, não deveria ser o contrário?

Não sou feminista. Não gosto de definições. Não gosto de sinalizar religião, ideologia, partido político, ou o que quer que seja, por ser muito plural e acreditar que certas nomenclaturas me limitem ao infinito que posso ser e pensar. Gosto de pensar em mim (e não que eu esteja correta em minha pretensão) como alguém que busca avaliar, antes de simplesmente escolher um lado e defender desse lado todos os seus interesses, indiscriminadamente, com unhas e dentes. Se você acha que isso faz de mim uma descrente sem qualquer personalidade ou conhecimento suficiente para defender uma causa, que seja.

Mas tenho certeza de que mesmo as feministas mais ferrenhas não desejariam esse tipo de feminismo, um feminismo que exclua, que ofenda, que seja competitivo em uma eterna guerra dos sexos, que tem como único fundamento provar quem é o melhor, meninos de bilau ou meninas de pepeca. Tenho certeza de que essas feministas querem uma sociedade em que mulheres sejam reconhecidas pelo seu valor, sem serem subjugadas pelo seu sexo. Pelo menos é nisso em que acredito. E as que não concordam, divirtam-se com o Lulu. Mas não me venham reclamar quando a pepeca que estiver para jogo for a sua. 

20 de nov. de 2013

Crônica de uma cadela pseudo-cult



Primeiramente, quero me apresentar. Sou só uma cadela-pseudo-intelectual que não entende de porcaria nenhuma, mas que tem uma relação quase que sexual-carnal com literatura e cinema. Manifestações artísticas em geral têm o poder de me emocionar, fazendo com que eu chegue ao ápice do gozo. Mas aí eu já não sei se a questão é de fato amor à poesia criada pelo bicho-homem, tão à frente do meu intelecto, ou a falta de um cachorro nesse mundo que realize as maiores barbaridade orgásticas durante o ato do coito comigo. Mas isso não importa.

O que importa é essa sensibilidade que tenho. Ela me levou a fazer uma singela observação que daria um ótimo objeto de estudo para o Tio Benjamim, que se amarra naquele papo de “reprodutibilidade técnica” e a tal da “aura” (oh!) das produções artísticas. Tudo começou em minha primeira visita ao Louvre. É isso mesmo, caras e caros leitores. Sou uma cadela de classe, que mija nos postes do Champs Elysses e pega ventinho no rabo nas bordas do Seine.

E como qualquer canina-pseudo-intelectual que se preze, eu não poderia ter outro sonho além do de conhecer a maior referência de exposições artísticas no mundo. Coisa de louco. Peguei o meu roteiro e comecei a estudar as possibilidades que eu exploraria em meu primeiro dia de visita. Sim, meus queridos e queridas, primeiro dia, porque para os que não sabem, impossível conhecer todas as exposições em uma única jornada. Além de o lugar ser enorme, fatalmente uma hora você vai se cansar e começar a ficar de saco cheio, não aproveitando 100% do que o santuário de obras dos cacuras-pop-star pode oferecer.

Aquilo ali é uma fonte de inspiração para os desejosos em incrementar seu capital cultural, principalmente para aqueles que gostam de fazer a linha “sou-cult-mona-refinada-entendida-de-alguma-coisa-de-história-da-arte”. Mas o que eu não consigo entender em vocês, ex-neandertais, é essa obsessão em ficar tirando foto até da hora em que está no banheiro cagando, o que não poderia ser diferente, é claro, no Louvre. Mas calma. Não que eu tenha visto alguém cagando por lá.


É que no meio daquela formigalhada de gente-bicho-humana, o que tinha de sobra era bípede mais preocupado em tirar foto de tudo o que via, do que tentar entender o que estava vendo e apreciar de fato as obras. “Olha o quadro famoso daquele cara que não sei o nome”. Flash. “Olha aquela escultura que a gente viu na TV”. Flash. E eu, humildemente de quatro e com meu rabinho todo abanativo, não sabia se prestava atenção na exposição ou se me preocupava em me desviar dos milhões de cliques que eram emitidos a todo o tempo, apesar de na entrada eu ter visto uma plaquinha que dava a entender que fotos eram proibidas. Não consegui tirar da cabeça a ideia de que eu era transeunte no tapete vermelho em que as estrelas de Hollywood andam no dia da cerimônia de entrega ao Oscar.

Ninguém resiste a um clichê

Para a minha primeira visita, escolhi, elegantemente, fazer un petit tour pela exposição de antiguidades orientais e depois dar um rolé na de antiguidades egípcias. Mas é claro que não poderia, de forma alguma, abandonar o clichezão-mor-do-Louvre, que é ver o quadro da tia Mona, pintado por Da Vinci e tão aclamado pelos sei lá quantos cantos do mundo. E foi nesse momento que me deparei com a cena mais bizarra do dia. Não era possível chegar sequer perto da obra (que para quem não sabe, é megapequena), porque havia uns vinte milhões de humanos entulhados em frente. Mas longe de estarem contemplando o quadro e tentando entender o porquê daquele raio de pintura ser tão famosa, os pensantes-bípedes estavam apenas preocupados em tirar uma quantidade imensa de fotos da imagem.

E agora eu explico o porquê de o tio Benjamin ter sido citado logo no início desse texto, escrito a partir de minha humilde reflexão animal, que tenta compreender a cabeça de vocês, humanos geneticamente evoluídos e portadores de polegar opositor. Em primeiro lugar, se vocês querem apenas a foto da Monalisa, existe uma coisinha chamada google. Você entra lá, coloca o nome da Mona-Pop na caixinha central e dá enter. Vão aparecer inúmeras fotos e você pode ficar olhando à vontade. Simples, não?

Se você quer guardar uma recordação dessa visita tão especial, tente se dar ao menos o trabalho de encontrar uma obra que não esteja tão facilmente disponibilizada na grande teia da também chamada Aldeia Global, como bem pontuou o delicinha MacLuhan, que não coincidentemente  deve ter sido grande coleguinha do tio Ben. Não tem muito cabimento você buscar a experiência de visitar um museu como o Louvre, para chegar lá e só ficar tirando fotos de todas as obras, que já estão disponibilizadas na internet. Tento entender qual é a lógica que se passa na cabeça de vocês, bípedes-genéticamente-evoluídos, mas juro que tá difícil.

Tudo bem, sempre tem aquele registro que você quer colocar no feice, para tirar onda com uzâmigos, uzinimigos e gente que tu nem conhece, de que esteve no Louvre. Mas cacete, se a intenção é essa, pelo menos se coloque à frente do raio da obra e saia você também na foto. Mas não precisa fazer o mesmo em TODAS que você vê. Porque ir para o Louvre fazer “book” na linha “vim aqui, sentei-lhe o dedo na câmera, e já posso ir embora”, sem sequer contemplar o que está à sua frente, é para mim, no mínimo, incoerente. Liga o computador que é mais prático.


Posso estar errada, minha crítica pode não ter fundamento algum, mas fala aí, Tio Ben, esse atual comportamento do público que se diz admirador de arte rende ou não rende pano pra manga? Pois é, coisas dessa pós-modernidade regida pela sociedade do espetáculo (Gui Debord, aí lóvi iou)... A Mona tá tão Pop, que a cadela aqui só pode contemplar a imagem dela, de fato, pela internet. Talvez pelas mesmas imagens que foram reproduzidas no dia em que estive lá, mas não consegui apreciar nada. E a tal da “aura” vai para a puta que o pariu. 

17 de jul. de 2013

Xangai não é Pequim

 
 
Acordo. Fui acordada. Ouço os acordes da troca do novo sinteco no apartamento vizinho ainda vazio. Doces acordes, espocam ao fundo como som ambiente, junto com britadeiras enfurecidas, fazendo backing vocal para buzinas. Começamos bem às 7h da manhã.
Tomo um café. Desço as escadas e vejo sempre a mesma velha camelô com labirintite. Consigo ver lirismo no jeito que ela conduz seu próprio negócio, pendurando modelos esvoaçantes em cabides tintinabulantes. “Roupas para pessoas conservadoras de opiniões flatulentas".
Penso: Que ótimo slogan ela tem. Atravesso a rua, guardadores de automóveis me espreitam maquiavélicos.
Sob a sombra do relógio/termômetro digital me sinto mais segura. Parcialmente escancarada eu pairo exemplar. Fico bem parada e dispersa como uma eclosão de farinha láctea. Sinto minhas narinas ressecarem em 3 segundos. Minha primeira alucinação involuntária: uma grande figura minha num cartaz publicitário. estou sugando com a “bocaberta" toda aquela emissão à carbonara.
««meu balão de fala como num gibi expressa»»
Não podemos hablar sobre carbono Não podemos hablar sobre aborto
Não podemos hablar sobre capiroto
Falemos de Pogobol
 
Freneticamente meu polegar apertando: “próxima música"…"próxima música"… samba não, rock não, vanguarda não, ópera não, pagode não, MBP não, fado não, funk não, fanfarra não, maxixe não, sertanejo, pop não, bossa nova não, axé não, câncer não, trilha sonora não… NÃO.  

O sol me trazendo significativas manchas epiteliais. Raios amenos de outono adulterado pelo buraco na camada de ozônio. Impressionante, nessas horas nada me apetece. Metaforicamente me torno um fungo em decomposição. Olho sempre para o mesmo prédio, para o mesmo andar, vigésimo quarto andar. A mesma janela entreaberta me exige atenção. Nunca uma viva alma cruza, nunca vida difusa. Sempre uma grade tilintado.
Saio da inércia, passa o ônibus, não é o meu. Sempre me confundo e me excito, mas nunca é o meu. Volto ao marasmo da espera, ainda estou debaixo do filete de sombra. Meu ombro queima. Na minha frente vejo a humanidade avançada. Homens com roupas cor de abóbora, capacetes fluorescentes, marmitas.
Vem o ônibus, entro, pego o troco. Desço na frente da casa deles. O velho estofador e sua esposa velha, catando pulgas de seus gatos na janela.
O velho estofando,  a velha catando pulgas, cena muito recorrente nas manhãs dos meus 20 anos. A velha louca às vezes me sorri, mas é bem raro, acontece quando passo de meias coloridas. Em geral me hostiliza com aquele olhar de velha sarcástica. Mas hoje, excepcionalmente, estava dormindo com a janela escancarada, de bruços, dividindo o pequeno espaço com pulgas e os fiéis felinos.