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21 de nov. de 2010

Perdida no País das Maravilhas


A certidão de nascimento poderia antever o futuro. O pai, fascinado pelos livros, registrou a filha com o nome de uma das maiores heroínas da literatura nacional. Cresceu lendo Machado de Assis, José de Alencar, Graciliano Ramos, Guimarães Rosa. No início, o aglomerado de folhas encadernadas com capa grossa eram apenas presentes. Com o tempo, passou a comprar seus próprios exemplares, e se apaixonou pela linguagem simples de Garcia Marquez, pela poesia de Clarice, profundidade de Dostoiévski, questionamentos de Vitor Hugo, obsessões de Proust.

Sua vida se resumia a ler, ler e ler. Ela se transformava e se reinventava naquelas personagens, vivia suas emoções, decepções, aventuras. Tudo o que não era, poderia ser enquanto lia. E mergulhava assim, como uma menina que se perde na tentativa de seguir um coelho; passava dias e dias sozinha, como um jovenzinho em seu planetinha, feliz por ter sua flor para regar. Era tragada por cada uma daquelas linhas, engolida no torpor da fantasia.

Queria tanto uma vida diferente de tudo o que vivia, que para encontrar um pedacinho da paz que nunca conheceu, preferiu, sem perceber, viver as vidas inventadas por tantos outros, quem sabe tão atormentados quanto ela. E quando apenas ler já não mais bastava para satisfazer sua fome, começou a escrever. E como escrever passou também a ser pouco, começou a rabiscar o papel com muita fúria, enquanto sangravam seus dedos, sagrava a tinta azul.

E quando rabiscar se tornou pouco, ela saiu para viver, mas a vida também era muito pouco, pouco perto de toda a fábula que criava, que lia, que queria. Precisava de um mundo onde sempre experimentasse o mais extremo de todas as sensações, presenciasse as mais inusitadas situações. Mas o que via, ali no real, era muito pouco. Era preto e branco demais. Mesmo quando agia de uma maneira que era vista como anormal por todas aquelas pessoas, normais demais no seu modo de ver. Ela simplesmente não se importava mais com julgamentos.

E mesmo sendo tudo em sua vida tão absurdo, tão intenso para tanta gente – mas nunca o suficiente para ela -, não desistia, e nessa caminhada ia se perdendo entre o real e o imaginário. Suas letras já não bastavam. Mesmo os heróis da ficção, representavam pouco agora. Ela precisava de mais, e nessa ânsia foi criando uma personagem de si mesma, baseada nos trechos mais expressivos de todos os livros que havia lido, durante toda sua vida.

Foi assim que Capitu enlouqueceu.

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