- Vou comprar um homem!
E comprou mesmo, e melhor, pela internet através do site “Mercado livre”.
No anúncio dizia claramente: “Homem colchão, depois de usar é só guardar”.
Ficou animada com a possibilidade e parcelou em 12 vezes.
A “encomenda” demorou 3 dias para chegar. Abriu a caixa e tirou de lá a promessa de salvação para a solidão e o tédio diário. Mas para ela, o mais emocionante da história era saber que a fisionomia do aparelho seria uma surpresa, “nenhum modelo se repete”, vinha impresso na embalagem brilhante. Rasgou a caixa com euforia pueril e deu de cara com a cara do cara que seria o seu redentor.
- Oi, sou seu novo homem. (Disse o rapaz saindo do colchão)
Ficou embasbacada olhando para aquela criatura, obviamente feliz por ser acionado através de um botão que ficava na altura do ânus.
- Não faço nada do que você não programar. Por favor, antes de usar, não se esqueça de me esquematizar. (Disse ele com sorriso na voz)
E assim ela fez. Através do manual projetou os detalhes para fazer com que o homem preenchesse seu vazio existencial.
Na primeira noite foi bem estranho dividir a cama com aquela coisa meio máquina, meio ser humano. Normal, ela já sabia que não ia ser mole, se apegava muito aos pequenos detalhes, mas se rendeu e deitou de leve no peito andrógeno da criatura afabilíssima.
Ao longo dos dias as coisas foram se encaixando, às vezes a impressão era de que o homem já tinha seus próprios impulsos e atitudes. Claro que isso também fazia parte da tecnologia revolucionária do projeto, afinal, uma mulher não quer mandar o tempo todo. Precisa sentir que o companheiro tem suas próprias vontades, mas nem sempre as realiza, por pura consideração e respeito ao relacionamento.
Eles conversavam muito todas as noites, rindo até o diafragma doer, ouviam rock e outros sons bem transados, ele lia poemas entoados, e ela retribuía com cafunés calorosos. Os dois dormiam bem abraçados, trocando respirações. Pela manhã ela acordava com carinho nas costas que ele fazia a fim de não deixá-la perder a hora. Despedia-se do seu homem com um beijo leve na boca e guardava-o de volta dentro do colchão até a próxima interação noturna.
Isso se repetiu por várias vezes, virando um ritual sagrado de felicidade. Parecia que
tudo estava completo e selado, “foi um achado te achar no mercado livre”, ela se declarava pra ele, sem pudor de não ser correspondida pela máquina.
O tempo foi passando, e tudo que “é”, um dia se transforma, a gente passa a ver mais coisas com o tempo das coisas, se permite, se encontra, esbarra com muita gente.
A menina que hora precisou de um projeto de homem idealizado para seu espírito triste, não carregava mais os mesmos questionamentos de antes. Havia partido para um outra esfera compassiva. Decidiu doar pra quem estivesse precisando, já podia respirar sem o aparelho, por mais que soubesse que iria sentir muita saudade. E anunciou num classificado barato:
Dou homem ideal
Vem numa caixa
de papel com metal
faz cafuné gostoso,
brinca, deita, rola
e tira bicho de pé
Blog inteligente, adorei...
ResponderExcluirAbraço!